Diário do Alentejo

“A complexidade dos casos tem vindo a aumentar ao nível da saúde mental, ausência de habitação, do consumo [de álcool e estupefacientes] e desemprego”

26 de abril 2025 - 08:00
Três Perguntas a Márcio Guerra, coordenador de comunicação da Cáritas Diocesana de Beja

A propósito recente da campanha “Alimentos com Alma”, promovido pela Cáritas Diocesana de Beja e integrado no programa “Estou Tão Perto Que Não Me Vês”, que visa recolher géneros alimentares destinados a pessoas em situação de sem-abrigo, o “Diário do Alentejo” conversou com o coordenador de comunicação da instituição de solidariedade social, Márcio Guerra, sobre o funcionamento da iniciativa, a evolução do número de pessoas em situação de sem-abrigo e das carências alimentares que lhe estão associadas, bem como as principais medidas que deverão ser tomadas para que esta problemática possa ser debelada.

 

Texto José Serrano

 

A Cáritas Diocesana de Beja lançou a campanha “Alimentos com Alma”, integrada no projeto “Estou Tão Perto Que Não Me Vês”, com o objetivo de recolher géneros alimentares destinados a pessoas em situação de sem-abrigo. Quem pode contribuir para esta campanha e de que forma o poderá fazer?

Esta campanha é exclusivamente dirigida ao reforço da resposta de pequeno-almoço da equipa de rua, destinada a pessoas em situação de sem-abrigo. Qualquer pessoa pode contribuir com leite, pão de forma, cereais, café, chá, açúcar, manteiga, queijo, fiambre, compotas, bolachas, queques, barras de cereais, sumos. As entregas são feitas na sede da Cáritas Diocesana de Beja ou mediante agendamento com a equipa de rua, através do telefone 962267988.

 

Como classifica, na cidade de Beja, a evolução do número de pessoas em situação de sem-abrigo e das carências alimentares que lhes estão associadas?

O número de pessoas em situação de sem-abrigo em Beja continua elevado. Em 2024 a equipa de rua teve contacto com 210 pessoas nesta situação ou em risco de exclusão habitacional, sendo que a complexidade dos casos tem vindo a aumentar ao nível da saúde mental, ausência de habitação, do consumo [de álcool e estupefacientes] e desemprego. As carências alimentares são, efetivamente, uma manifestação da exclusão social, mas quase nunca ocorrem isoladamente.

Quais as principais medidas que deverão ser tomadas para que esta problemática possa ser debelada?

As causas e fatores para que uma pessoa esteja em situação de sem-abrigo são multifatoriais, logo, a abordagem a esta problemática tem de ter diferentes níveis de atuação e vários agentes envolvidos. Consideramos, num primeiro nível de atuação, o alinhamento político com o envolvimento e compromisso de autarcas e Governo, em áreas transversais de atuação, como está explanado na Estratégia Nacional para a Integração das Pessoas em Situação de Sem-Abrigo 2025-2030, investindo mais na construção de habitação ou em modelos de housing first, a promoção de planos de formação adequados, em áreas que promovam a integração social e laboral, assim como a promoção da empregabilidade com direitos e a promoção e acesso à saúde, nomeadamente, na área da saúde mental e das dependências, com mais meios humanos e recursos financeiros. Num nível mais técnico-operacional consideramos que a resposta deve ser articulada, contínua e centrada na dignidade humana, privilegiando metodologias de proximidade e participação, respeitando o ritmo e as escolhas de cada pessoa. Toda a intervenção e atuação com esta população deve estar alinhada com o diagnóstico do Núcleo de Planeamento e Intervenção Sem-Abrigo (Npisa), por serem os órgãos e instrumentos de planeamento passíveis de mobilizar recursos, localmente, para resolver muitas das situações identificadas, visando a promoção da autonomia e a corresponsabilização como pilares essenciais da intervenção. 

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